Presidente do Tribunal de Contas diz que a maioria dos prefeitos é honesta

FONTE: TRIBUNA DA BAHIA

Em meio a uma crise financeira com raros precedentes na história, o presidente do Tribunal de Contas dos Municípios (TCM), Paulo Maracajá, avalia que esse fator tem sido preponderante para o grande número de rejeições das contas das prefeituras e órgãos municipais. Para Maracajá, no entanto, “a maioria dos prefeitos é honesta”.

Responsável pelo órgão que verifica o cumprimento das normas, ele verifica que mudanças na legislação são necessárias, principalmente na forma de cobrança de multas e ressarcimentos. “Acho que não é cabível a pessoa cobrar de si próprio. Está errada a lei”, provoca.

Ex-presidente do Bahia, Maracajá promete não fazer campanha, mas já tem seu voto, anunciado em entrevista exclusiva à Tribuna.

Tribuna - O TCM tem sido rígido no julgamento das contas de Câmaras e prefeituras. Como vê o alto número de rejeições?
Paulo Maracajá – Eu não diria que está sendo rígido, eu diria que está cumprindo a lei. E nós, inclusive, quando às vezes um processo está em pauta com um conselheiro, aparece aqui o prefeito, ou secretário do prefeito, ou preposto do prefeito, pede para um prazo para apresentar documentos, a gente dá. Às vezes você vai julgar já a conta e ele pede para apresentar documento, a gente adia o julgamento. Agora, se a lei diz, por exemplo, que você tem que rejeitar uma conta se ele não cumprir os 25% deeducação, os 15% de saúde e o Fundeb, nós não estamos sendo errados, estamos cumprindo a lei. A lei que manda. A questão de pessoal. Não pode gastar mais do que 54%. Ele tem que cumprir. Não é rigidez. A rigidez é da lei, não é da gente. Nós somos flexíveis com ele. A lei que nos obriga a fazer a rigidez.

Tribuna – Quais os erros mais frequentes? Há dolo ou má informação?
Maracajá – Para mim, há, em muitos casos, a má informação. Nós temos tentado fazer muitos cursos, inclusive, encontros regionais em 12 municípios do estado da Bahia. Tivemos uma vez no Centro de Convenções mais de 1.200 pessoas. Então, o que se nota é que nós estamos tentando informar. Combinamos com a prefeita Maria Quitéria, que é presidente da UPB (União dos Municípios da Bahia), para começar no dia 10 de setembro, e vai até março, 10 encontros, primeiro em Salvador, depois em Vitória da Conquista, cidades maiores, Barreiras, Feira de Santana, para poder fazer isso. Nós estamos distribuindo cartilhas. Agora, você pergunta: tem dolo em alguns? Numa minoria. Eu considero que a maioria dos prefeitos é honesta. Agora tem uma minoria que realmente usa dolo.

Tribuna – O tribunal tem fechado o cerco contra os gestores irregulares. O problema é que o recurso que é cobrado nas multas não é devolvido aos cofres públicos. Quem é responsável por fiscalizar?
Maracajá – Quem tem que fazer a cobrança é o prefeito. Por exemplo, o prefeito ACM Neto vai ter obrigação de cobrar os débitos do prefeito João Henrique. Tem muitas multas e ressarcimentos. Mas agora eu fui informado em dezembro que o prefeito conseguiu uma liminar para não ser cobrado. Se consegue uma liminar, isso é um obstáculo para o tribunal. Se nós estamos com a liminar que dá liberdade ao prefeito, o que é que nós podemos fazer? Nada. Agora, se não houvesse a liminar, nós tínhamos que obrigar o prefeito ACM Neto fazer a cobrança de João Henrique, e se por acaso prescrevesse isso aí, entraria para despesa dele, para a responsabilidade dele. E, se por ventura, o prefeito tem que fazer a cobrança do outro prefeito, se esse prefeito não o fizer, será penalizado, e, nas contas dele quando forem analisadas, ele pode ter contas rejeitadas se por acaso ele não pagou as multas ou ressarcimentos que o tribunal mandou.

Tribuna – Não é um contrassenso o Executivo municipal cobrar do próprio Executivo municipal?
Maracajá – Acho um contrassenso. Eu acho que não deveria ser, mas a lei que diz isso. Eu acho que não é cabível a pessoa cobrar de si próprio. Está errada a lei. Como tem muitas coisas de cobrança que nós temos que modificar. Eu acho que os prefeitos têm visto que tem lei draconiana com eles. Repare que a presidente Dilma (Rousseff) em uma boa hora baixou a alíquota de dez produtos. E diminuiu a arrecadação dos municípios. Teria que diminuir também os índices que ele vai fazer. Agora quem pode modificar? O Congresso Nacional. Fora isso, nós estamos com a lei nos deixando bitolados a seguir a lei de responsabilidade fiscal.

Tribuna – As prefeituras estão com suas finanças cada vez mais sufocadas, por convênios firmados com o próprio governo federal. O que fazer para fechar a conta, tendo como base a Lei de Responsabilidade Fiscal?
Maracajá – Tem que acontecer uma mudança no Congresso Nacional. Nós estamos, por exemplo, procurando facilitar. Agora, se a lei está dizendo que nós não podemos fazer, nós não podemos ser fatores. Nós temos que seguir aquilo. Por exemplo, teve aqui o prefeito Jabes Ribeiro. Está com uma porção de problemas em Ilhéus. Mas os problemas dele não podem passar a ser nossos. Porque ele pegou a prefeitura de Ilhéus, segundo informações dele, calamitosa. Tanto que está havendo movimento grevista para ele fazer isso, para fazer aquilo. Se ele fizer, ele vai enfrentar e lei e vai ser punido. Eu conheço prefeitos que estiveram aqui para dizer que encontraram a terra arrasada quando assumiram. Já outros não pegaram assim. Eles realmente têm uma dificuldade. Se não me engano, 217 municípios estão em regime de emergência porque estão sofrendo muito com a seca. Outro dia nós pegamos um prefeito desse que estava gastando não-sei-quanto. Tem que ser punido? Tem. O município está campado, mas ele gasta em festejos. Nós procuramos ser coerentes. Claro que às vezes nós não abrangemos tudo aquilo que nós pensamos.

Tribuna – Como o senhor vê as críticas do ex-prefeito João Henrique para o tribunal? Acredita que ele vai conseguir driblar a legislação e se candidatar em 2014?
Maracajá – O prefeito João Henrique teve três contas rejeitadas, se não me engano, ainda falta a Câmara Municipal julgar uma. Já julgou duas nos dando razão. Você vai verificar que tudo aquilo que foi condenado, ele está errado. Agora, ele vai e consegue uma liminar. Quando ele consegue uma liminar, nos deixa numa situação difícil. Nós estamos tentando derrubar. Nós não, a Procuradoria Geral do Estado, porque nós não podemos legislar. Nós temos que obedecer a procuradoria e a procuradoria tem sido sensacional. Estamos tentando derrubar a liminar, mas está trancando. Ele vai pagar, agora quanto a ele ficar inelegível ou não, depende da Procuradoria Eleitoral, Sidney Madruga.

Tribuna – Há quem diga que a defesa do ex-prefeito vai usar a tese de que não houve dolo. Acredita que ele vai conseguir driblar a Ficha Limpa e se candidatar?
Maracajá – Eu diria a você que o prefeito tem um bom advogado, que é o Celso Castro. Então procura as brechas para poder fugir do cumprimento daquilo que foi cometido. A semana passada, o conselheiro Ramon de Moreira multou o prefeito para devolver R$ 400 e tantos mil. Cada hora ele acumula. Isso aí não pode ficar assim. Vira deboche. Como há pouco o Congresso Nacional debochou do povo brasileiro ao pegar um deputado que chegou algemado, absolve no plenário e depois ele volta algemado para a cadeia. Então não pode fazer isso. Eu acho que a lei tem que ir até certo ponto. E não da maneira como é facilitada. O cara contrata um bom advogado e consegue se livrar. Nós estamos tentando derrubar essa liminar dele.

Tribuna – Ex-prefeitos como Luiz Caetano (Camaçari) e João Gualberto (Mata de São João) também podem ser candidatos em 2014. Existe algum problema no tribunal que poderia inviabilizar a participação deles no pleito?
Maracajá – Eu vou dizer uma parte bem inicial. Luiz Caetano e João Gualberto são completamente diferentes de João Henrique. Porque Caetano, segundo me consta, não teve nenhuma conta rejeitada. João Gualberto também não teve. Agora, eu queria dizer um detalhe que eu pulei. Quem determina quem vai na ficha suja não somos nós do tribunal. Quem declara é outro órgão. É a Justiça Eleitoral que declara. Nós somos nós. Nós pegamos a documentação e mandamos. Fizemos até uma cooperação técnica com Madruga, pegamos tudo que nós fizemos e mandamos para ele. Ele é um sujeito seguro. Não fomos nós que declaramos. É a Justiça que faz isso. É um absurdo e um contrassenso. As contas dos prefeitos são rejeitadas. A Câmara vai julgar se nós estamos certos ou não? Nós que inclusive fiscalizamos as contas da Câmara? Isso é uma incoerência. E se a Câmara disser que as contas estão certas, nosso parecer ficaria como? Já quando nós julgamos a Câmara Municipal, de qualquer uma que seja, não há recurso para isso. Somos a última instância disso. Mas prefeitura não. Prefeitura ainda tem como último recurso a Câmara Municipal.

Tribuna – Qual a avaliação que o senhor faz da atuação do Tribunal de Contas na fiscalização e no acompanhamento da execução das prefeituras e Câmaras de Vereadores?
Maracajá – Eu faço uma comparação muito boa com o que eu lhe disse antes. O tribunal tem uma vantagem de ter muitos técnicos bons. Eu diria que o corpo técnico do Tribunal de Contas dos Municípios é muito bom. Nós temos a vantagem porque essas pessoas se esmeram em atender bem. Além do mais, esse suporte profissional é necessário, pois todos nós sabemos que hoje está superdifícil para um prefeito cumprir todas as exigências que aí estão, mas nem por isso o tribunal deixa de exigir, já que existe uma norma que diz que está previamente estabelecido isso. Tem que ser assim.

Tribuna – Esse engessamento misturado com as dificuldades financeiras pode inviabilizar as administrações públicas?
Maracajá – Vai dar problema. Você vê que, por exemplo, o Caires, que coordena a primeira CCE, inclusive Salvador, Camaçari está com ele. Ele procura orientar o pessoal, mas acontece que eles estão cada vez mais com a corda no pescoço. O pessoal não tem dinheiro. Há dificuldades que nós vemos latentes, como a que eu falei há pouco, do prefeito Jabes Ribeiro, em Ilhéus. A situação dele é caótica. Dele não, ele como prefeito está com dificuldade tremenda para resolver. E outros municípios também têm sérias dificuldades. Você não vê nenhum município nadando em dinheiro. Salvador mesmo, eu sei que está numa dificuldade muito grande.

Tribuna – Já tem algum resultado prático desse trabalho que foi feito ou é um trabalho gradativo que exige um acompanhamento?
Maracajá – Infelizmente nós tivemos a mudança de gestão. Quase 300 municípios tiveram renovação dos gestores. Não há uma maturidade suficiente nos gestores para manter determinados servidores, principalmente no que diz respeito aos controles internos, que é a peça-chave em cada município. Então, infelizmente, aquilo em que o tribunal mais investiu, que foi nos controles internos, houve uma alteração muito grande de servidores nos controles internos e é exatamente dessa necessidade de voltarmos a essa carga de treinamento. De novo qualificarmos esse pessoal, que é onde vamos ter o retorno dessa qualificação e onde vai ajudar os municípios a ter melhor execução no dia a dia dessas prestações de contas. É um dia a dia que só ao longo da gestão é que você vai ter o retorno. O que a gente vê é que ao longo de uma história, o Tribunal não consegue, por exemplo, mudar de imediato, porque, infelizmente, a carência de pessoal não é só de médicos, mas a carência de profissionais nos rincões do estado é muito grande.

Tribuna – Como cidadão, como o senhor avalia o governo Jaques Wagner?
Maracajá – Ele tem sido muito correto com o Tribunal, tem cumprido com as obrigações constitucionais, agora mesmo nos chamou à Governadoria para dizer que precisava fazer certas modificações, mais economia. Eu disse que nós estamos aqui para aquilo que é possível. Não temos feito nada demais e o governador falou que vai ter que diminuir os recursos, porque o estado da Bahia está em dificuldade financeira, o que é verdade. Ele tem tido um relacionamento muito cordial, muito respeitoso.

Tribuna – E com relação ao prefeito ACM Neto, o senhor acredita que a cidade vai conseguir sair do estado de degradação que se encontra hoje?
Maracajá – Eu levo fé e levo esperança. Eu moro em Salvador há 69 anos. Fui vereador seis anos. Fui deputado com base maior em Salvador por 12 anos. Salvador é aquela cidade que nós amamos, que nós gostamos, que nós queremos cada vez melhor. Às vezes quando eu vejo esse tráfego todo embolado, travado, eu penso: “estão consertando buracos”. Pelo menos, estão tirando buraco, são menos buracos na rua. Nunca se viu tanto engarrafamento. Você vê que há uma planificação desses engarrafamentos que tem. Eu faço fé que o prefeito ACM Neto faça uma bela gestão e consiga que todos nós, soteropolitanos, tenhamos uma Salvador mais limpa, mais cuidada, menos embolada de tráfego, que isso facilite a habitação de todos nós, que as ruas não estejam tão esburacadas. Quando chove, Salvador dissolve, parecendo sorvete. Eu sei que isso não se pode fazer de uma hora para outra. É uma coisa que precisa ser feita diuturnamente.

Tribuna - O senhor acredita que o Tribunal de Contas do Estado deveria ser mais célere como o TCM para julgar as contas, inclusive da Assembleia, que tem várias acumuladas sem julgamento?
Maracajá – Eu acho que o Tribunal de Contas do Estado é um grande órgão, o presidente é meu amigo, Zilton Rocha, que é um bravo conselheiro, e sei que ele está cumprindo a missão dele da melhor maneira que pode.

Tribuna – Depois dos protestos que aconteceram no país em junho, a população esperava um menor corporativismo, sobretudo do Congresso Nacional. Como o senhor vê a política hoje do país?
Maracajá – Com uma falta de sensibilidade muito grande. Você vê que o povo quer mudanças e o sentimento começou natural. Eu diria que são exceções esse pessoal que está com depredações e com vandalismo. A maioria esmagadora quer mudanças. Você não pode pegar um deputado que é condenado, nós falamos de ficha suja e esse é ficha suja, tá preso e algemado, chega algemado no Congresso Nacional, tira a algema para entrar no Congresso e depois coloca a algema quando sai, isso é um deboche, um escárnio com a opinião pública. Foi um dia vergonhoso para o Congresso. Eu estou falando como cidadão. Não como presidente do tribunal. É uma vergonha. É por isso que o presidente (Henrique Eduardo) Alves disse que é uma coisa certa, que não pode colocar mais nenhum deputado para julgar com voto secreto. O voto tem que ser aberto. Porque você não fica na dúvida. Cento e tantos votaram para manter como deputado alguém que foi condenado. Eu vi até Gilmar Mendes e Marco Aurélio (Melo) tecer comentários jocosos e com razão. Isso é brincadeira com a opinião pública. Por isso que às vezes há revolta e diz que não sabe por que aconteceu aquilo. O povo está chateado, o povo quer modificações. E o povo vê acontecer um fato como esse, é realmente triste.

Tribuna – Não poderia deixar de perguntar. Como o senhor está vendo a sucessão no Bahia? Qual será o candidato do senhor?
Maracajá – Fernando Schmidt. Eu vou votar em Fernando Schmidt. O processo de mudança no comando do time está sendo democrático, eu espero que nesse processo democrático todos compareçam lá na urna para escolher o seu presidente. Eu, apenas como tricolor, não vou dizer a você não vou votar. Não vou fazer campanha porque eu não posso fazer campanha como presidente do tribunal. Não posso fazer. Mas dizer a você que vou votar em Schmidt, eu vou votar. Eu fiz vestibular junto com ele, na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, em 1966 e nos formamos juntos. Eu, ele e Saul Quadros. Depois, em 1972, eu fui para o Bahia e era diretor de futebol da gestão de Wilson Trindade, aí eu chamei Schmidt para ser meu subdiretor de futebol, ele e Tere Andrade. Aí veio a gestão do Comodoro Luís Alberto de Marques e foi criado o vice-presidente. Eu fui para vice de futebol e Schmidt vice administrativo. E depois, em 1976, Schmidt foi eleito com o meu apoio presidente do Bahia. Ele foi 1976, 1977 e 1978 e eu fui o diretor de futebol dele. E fomos campeões juntos. Depois nos separamos em 1979, quando me elegi presidente por divergências políticas. Ele apoiava Domingos Leonelli e Lídice da Mata e eu apoiava o grupo de Antonio Carlos Magalhães. Mas continua o respeito mútuo um pelo outro, fomos colegas de turno, fomos companheiros de diretoria.

Tribuna – Acredita que ele tem condições de reposicionar o time?
Maracajá – Acho que tem. Anos depois que voltou, se ele voltou sendo um homem inteligente como ele, sabe que tem uma missão muito grande. A pessoa que está com uma certa idade como eu e ele, você quando está numa missão, começa a olhar. Será que vai dar certo? Acho que Schmidt é um cara empreendedor, ele é um cara cabeça feita. Ele não ia aceitar ser candidato se não tivesse condições de fazer. E desejo, se por acaso ele for eleito, que faça uma grande administração e o meu Bahia seja novamente campeão.

Colaboraram: Fernanda Chagas e Fernando Duarte

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